Prisões no Rio são políticas, e não jurídicas, dizem advogados

Manifestação interdita parcialmente a avenida Paulista no sentido Consolação.

Para membro do Instituto de Defesa dos Direitos Humanos, violência e abuso policial ocorrem com ‘aval’ do Judiciário

Foram presos, no sábado (12/7), 28 ativistas de manifestações de rua na chamada Operação Firewall 2, executada pela Polícia Civil do Rio de Janeiro. A operação foi conduzida pela Delegacia de Repressão a Crimes de Informática e aconteceu na véspera da final da Copa do Mundo, disputada no estádio do Maracanã.

Os mandados de prisão foram expedidos na quinta-feira (10), juntos com outros dois mandados de busca. A decisão é da 27.ª Vara Federal da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, e decretou a prisão provisória – que tem validade de cinco dias, com a possibilidade de renovação de mais cinco – dos ativistas.

As prisões são ilegais e não contam com as provas necessárias, segundo advogados que acompanham o caso. Para Lucas Sada, advogado do IDDH (Instituto de Defensores de Diretos Humanos) e do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, a violência policial na repressão às manifestações de rua conta com a chancela do Poder Judiciário.

“Foi uma ação orquestrada por parte da Polícia Civil e serviu como uma forma de intimidação, de retirar essas pessoas da rua. São prisões juridicamente ilegais, e ficou muito claro que são mais políticas do que jurídicas. A polícia age desta maneira com a chancela do Judiciário”, afirma. As datas das prisões, no dia 12,  e da final da Copa, no dia 13, segundo Sada, não são mera coincidência, e sim uma forma arbitrária de evitar manifestações e possíveis tensões sociais.

Os presos são acusados de praticar atos de vandalismo em protestos desde junho do ano passado. A acusação é de associação criminosa, crime antes tipificado como formação de quadrilha, pelo artigo 288 do Código Penal.

Foram impetrados sete habeas corpus no mesmo dia das prisões. O Sindicato dos Jornalistas entrou com um deles pedindo a soltura da jornalista do portal EBC (Empresa Brasileira de Comunicação), Joseane Maria Araújo de Freitas. A Comissão de Prerrogativas da OAB-RJ (Rio de Janeiro) entrou com outro em favor Eloisa Samy Santiago. A DP-RJ (Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro) entrou com mais um, e o IDDH com quatro. Todos foram negados pela Justiça.

Mandado genérico

“É uma decisão que não individualiza nenhuma conduta, coloca tudo de forma genérica, e coloca que há elementos no inquérito que permitem entender que é raro e imprescindível decretar prisão”, diz Sada. A decisão judicial, de uma página, não cita o número exato de prisões provisórias. Para ele, este é um argumento equivocado. Não haveria necessidade de prender os detidos para o inquérito se dar no seu transcurso regular.

A decisão afirma ainda que “verifica-se, também, que há indícios de que está sendo planejada a realização de atos de extrema violência para os próximos dias, a fim de aproveitar a visibilidade decorrente da cobertura da Copa do Mundo de futebol, sendo necessária a atuação policial para impedir a consumação desse objetivo e também para identificar os demais integrantes da associação.”

Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal da OAB, Wadih Damous, “foram prisões sem provas”, que, em linhas gerais, tinham o objetivo final de impedir protestos contra a copa, e que “acabaram atingindo o direito à livre manifestação”. “O simples ato de se manifestar virou, no país, uma atividade criminosa”, complementa o advogado.

Em entrevista coletiva na tarde deste sábado, o delegado Fernando Veloso, chefe da Polícia Civil, alegou que as pessoas presas estavam se mobilizando “de forma clara” para organizar atos de violência, indicando que participavam de movimentos como OATL (Organização Anarquista Terra e Liberdade), FIP (Frente Independente Popular), MEPR (Movimento Estudantil Popular Revolucionário), Anonymous e Black Bloc. Entre elas, está a ativista Elisa Quadros (a “Sininho”), presa em Porto Alegre.

Entre os materiais apreendidos pela Polícia Civil durante o cumprimento dos mandados há uma arma de fogo, mas ela pertence ao pai de uma adolescente apreendida. O homem tem posse legal da arma. A informação é de que a posse estaria fora de validade.

Advogados alegam que a inspetora policial que fez a apreensão ignorava o fato de a menina apreendida ter 16 anos e não ser emancipada. Ela responsabilizou a menor de idade pela posse da arma, considerando que a adolescente seria dona da casa. Delegados confirmaram que a operação da Polícia Civil começou em setembro do ano passado.

Democracia e ditadura

Há uma onda conservadora crescente que criminaliza, em todas as esferas do poder, os movimentos sociais, assinala Damous. Para ele, essa criminalização se acentuou após as manifestações de rua de junho do ano passado, e se reflete em decisões como esta, do Poder Judiciário, em outras, do Poder Executivo, que, principalmente no estado de São Paulo, tem patrocinado a violência e o abuso policial em manifestações de rua. Ele também aponta decisões do Poder Legislativo, que em estados, como Minas Gerais e São Paulo, aprovou leis antidemocráticas, segundo entidades de direitos humanos, como a proibição do uso de máscaras em manifestações.

Além dos três poderes, o conservadorismo conta, atualmente com parcelas da sociedade mais “tradicionais”, segundo ele. “Essa decisão judicial expressa uma tendência nacional, que está contaminando decisões e ações em várias esferas. Mesmo depois da democracia formal, que conseguimos com a Constituição de 1888, existe uma latente linha autoritária que perpassa o Estado, desde sempre, seja na democracia ou na ditadura.”

Ele faz ainda uma comparação com órgãos repressores existente no Estado de exceção do regime militar (1964-85). Se hoje não existe o Ato Institucional n.º 5, ou o Dops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social), existe a Delegacia de Repressão a Crimes de Informática. “Esta é uma delegacia que mapeia e monitora aqueles que convocam manifestações pela internet”.

Aval

A violência e o abuso policial contam, cada vez mais, com o aval do Poder Judiciário, segundo Lucas Sada. Ele entrou com um pedido de mandado de segurança coletivo preventivo para que a Polícia Militar do Rio não impedisse a livre circulação de jornalistas nas áreas próximas ao Maracanã. Desde o primeiro jogo no estádio, a PM vinha realizando barreira policial nas imediações, impedindo acesso de jornalistas e de outros passantes.

O mandado ressalta que, segundo relatório produzido pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), ocorreram 190 (cento e noventa) agressões a jornalistas, entre maio de 2013 e 18 de Junho de 2014, das quais 88% foram praticadas por policiais.

O mandado de segurança foi negado. “Depois que ocorrem as violações aos direitos fundamentais, muito se fala em abuso e nas violações. Mas essas violações acontecem com a chancela do Poder Judiciário brasileiro”, alerta

Fonte: Última Instância

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