O juiz da 2ª Vara Criminal de Brasília absolveu o médico Heverton Octacílio de Campos Menezes, denunciado pelo MPDFT (Ministério Público do Distrito Federal e Territórios) pela prática de injúria racial contra Marina Serafim dos Reis. Na mesma decisão, o juiz desclassificou a conduta do réu pelo crime de injúria, cuja pena deverá ser convertida para sursis processual, medida alternativa prevista na Lei 9.099/95.
Segundo a denúncia, “No dia 29 de abril de 2012, por volta das 15h, na bilheteria do Cine Cultura, no Shopping Liberty Mall, o acusado, voluntária conscientemente com clara intenção de injuriar, utilizando-se de elementos referentes à cor negra, ofendeu a dignidade e o decoro de Marina Serafim dos Reis.” Ainda segundo a peça acusatória, o médico teria praticado preconceito de raça e cor ao afirmar: “Sua negra, volta para a África. Você está no lugar errado… Seu lugar não é aqui lidando com gente e sim com animais…”
O MPDFT pediu a condenação do réu nas penas previstas no art. 140, § 3º, c/c art. 141, inc. II do Código Penal e art. 20 da Lei de Combate ao Racismo,nº 7.716/89, que disciplina os crimes de preconceito.
Heverton Octacílio negou a prática dos crimes a ele imputados. Segundo afirmou, no dia dos fatos foi ao cinema para ver o filme Habemus Papam. A fila tinha cerca de 10 pessoas, todas jovens, e a sessão já teria começado. Por causa disso e pela sua idade, resolveu pedir atendimento preferencial. No entanto, teria sido atendido pela moça da bilheteria de forma “ríspida”, afirmando: “Você parenta ter 40 anos, volte pro rabo da fila.” Decidiu insistir e mostrar a identidade, mas a atendente se recusou a ver o documento e tornou a mandá-lo voltar para o final da fila. Depois de contrariado teria dito à moça: “O seu serviço foi muito ruim!”
Afirmou também que o fato de ela ter lhe negado o atendimento preferencial gerou nas outras pessoas o sentimento de que ele estaria tentando furar fila, “criando-se um perigo comportamental de massa, pois passaram a me xingar e a dizer que eu seria preso”. Com medo das reações, decidiu sair às pressas do shopping para evitar a possibilidade de “ser linchado ou agredido e para evitar situações mais perigosas para si e para os presentes”.
Várias testemunhas do caso foram arroladas para depor. Duas delas, arroladas pela acusação, confirmaram as agressões orais de cunho racista do médico contra a atendente. Outras, arroladas pela defesa, negaram ter ouvido qualquer ofensa relacionada à cor da atendente. De acordo com estes depoimentos, a moça se recusara a dar o atendimento preferencial solicitado pelo médico e os outros presentes passaram a hostilizá-lo pela conduta de fura-fila. Clientes e funcionários do convívio do médico também negaram ter presenciado algum dia qualquer atitude racista ou preconceituosa por parte dele.
Ao sentenciar o processo, o juiz ponderou sobre as contradições dos testemunhos: “Não há dúvidas de que o acusado ofendeu a dignidade da vítima, fazendo referências a sua cor. Porém, entendo que a ofensa não se deu em um contexto de discriminação racial, restando provado que o desentendimento entre os dois ocorreu apenas em razão da discordância sobre o momento em que deveria ter sido realizado o atendimento. Da mesma forma, não há nenhuma prova nos autos da prática do crime de racismo, Ao contrário, há depoimentos de várias testemunhas de que o acusado não faz discernimento entre pessoas negras ou brancas. Entendo que a conduta imputada não revela prática, induzimento ou incitação à discriminação ou preconceito de raça, bem como, não vislumbro o dolo nesse sentido”, finalizou.
A decisão do magistrado é do 1º Grau de Jurisdição e ainda cabe recurso.
Fonte: Última Instância