Entenda as razões da alta e os efeitos do dólar a R$ 3

Embora tenho rompido a barreira dos R$ 3 pela primeira vez em mais de 10 anos nesta quarta-feira (4), após o presidente do Senado rejeitar a medida provisória que trata de desonerações tributárias, o dólar já vinha se valorizando. E a tendência, segundo analistas ouvidos , é que a moeda dos EUA permaneça num patamar mais elevado diante do cenário político e econômico conturbado e das incertezas sobre o ajuste das contas públicas brasileiras.

“Romper a barreira dos R$ 3 tem um fator psicológico, mas não tem nada de muito crítico, pois não chega a ser uma barreira de verdade. Apenas chama a atenção demais”, afirma o professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), Fabio Kanczuk. “A alta de hoje está mais associada a uma derrota política do governo do que a fundamentos do longo prazo”.

Para o economista da Tendências Rodolfo Oliveira, ainda não é possível afirmar que o patamar de R$ 3 veio para ficar.

O dólar não está desajustado. Se não houvesse esta interferência do BC, o câmbio já deveria estar há alguns meses no patamar de R$ 2,90, que é razoável e aceitável hoje”
Otto Nogami, professor do Insper

“A devolução da MP mostra que o governo vai ter mais dificuldade para fazer o ajuste fiscal e que vai ter barreiras políticas no caminho”, destaca o economista. “É um momento de tensão. Hoje, o real está se desvalorizando muito mais do que qualquer moeda. Mas podem vir outros tipos de sinais e a situação pode se acomodar”, completa.

‘Dólar está ajustado’
O professor do Insper Otto Nogami avalia que a forte alta do dólar nesta quarta esteja sendo influenciada também por uma significativa ação especulativa e que a tendência e que o câmbio recue nos próximos dias. Ele considera, no entanto, natural e razoável uma cotação acima de R$ 2,90 em razão da diminuição das intervenções do Banco Central no mercado de câmbio.

“O dólar não está desajustado. Se não houvesse esta interferência do BC, o câmbio já deveria estar há alguns meses no patamar de R$ 2,90, que é razoável e aceitável hoje”, diz Nogami, lembrando que fatores externos como a política monetária dos EUA e DO Banco Central da Europa também têm contribuído para a desvalorização das moedas frente ao dólar.

Segundo ele, embora a alta do dólar traga consequências para a economia, o dólar voltou a ter um “preço natural de mercado” o que contribui para o resgate do chamado tripé macroeconômico, formado pelo câmbio flutuante, pelas metas fiscais e de inflação.

“Não adianta estar com o dólar num patamar razoável se as outras lições de casa não estão sendo feitas. Nesse tripé não adianta ajustar apenas um componente para garantir a sustentabilidade da economia”, afima Nogami. “Há outros aspectos a serem observados, como a questão do ajuste fiscal e dos investimentos no setor produtivo e em infraestrutura”, completa.

Daí a expectativa em torno da capacidade do governo de reequilibras as contas públicas. “Não conseguir cumprir a meta de 1,2% de superávit em 2015 coloca em dúvida todo esse processo de ajuste nas contas públicas. É isto que o mercado está hoje precificando, o aumento do risco disso não ocorrer”, diz Rodolfo Oliveira, da Tendências.

Quem ganha, quem perde
Na lista de beneficiados pelo dólar mais alto, além dos agentes do mercado financeiro, estão os exportadores. Mas nem mesmo para este grupo há garantia de grandes ganhos.

“A questão é que os problemas dos exportadores não passam só pelo câmbio. Há um problema de competitividade da economia brasileira como um todo”, afirma Oliveira. “Se a inflação subir muito, também não adianta muito o dólar subir. Acaba ficando elas por elas”, acrescenta.

O consumidor perde feio. Aquela história de ir para a Disneylândia acabou. Para o empresário exportador, para hotéis pode ser bom, mas para o cidadão comum a percepção é que se está ficando mais pobre”
Fabio Kanczuk, professsor da FEA-USP

Os números da balança comercial mostram que não está sendo fácil colocar o produto nacional em outros países, mesmo com um câmbio mais favorável. Nos 2 primeiros meses do ano, o saldo negativo somou US$ 6 bilhões.

Segundo os analistas, os efeitos negativos superam os positivos. “A consequência mais imediata é para o produto importado, porque estamos importando muitos insumos que alimentam a nossa base produtiva, e a tendência natural será a alta nos preços”, diz Nogami.

Dólar mais alto significa também que produtos importados e feitos no país com insumos vindos de outros países também tendem a ficar mais caros, o que representa um fator a mais de pressão sobre a inflação, podendo até mesmo pesar na decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) sobre a definição da taxa básica de juros, atualmente em 12,25% ao ano, maior patamar desde meados de 2011.

“O consumidor perde feio. Aquela história de ir para a Disneylândia acabou. Para o empresário exportador, para hotéis pode ser bom, mas para o cidadão comum a percepção é que se está ficando mais pobre”, diz Fabio Kanczuk, da FEA-USP.

Nas casas de câmbio, o dólar turismo está sendo negociado acima de R$ 3 desde fevereiro.

“Uma valorização do dólar costuma ter dois grandes efeitos: melhora a exportação e exige mais juros para controlar a inflação. Em geral, o efeito de ter que controlar a inflação acaba superando o efeito positivo das exportações e o resultado líquido acaba sendo negativo”, completa.

Fonte: G1

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